Malha fina da Receita Federal: 160 filtros automatizados monitoram contribuintes
Ampliado controle sobre movimentações financeiras gera debates sobre sonegação, carga tributária e o impacto de avanços tecnológicos na declaração do Imposto de Renda.
A Receita Federal tem intensificado o controle sobre as informações financeiras dos contribuintes por meio de 160 filtros de cruzamento de dados automatizados, utilizados na análise das declarações do Imposto de Renda de Pessoa Física (IRPF). A ampliação da fiscalização gerou polêmica recentemente, após o governo propor maior controle sobre transferências, incluindo operações via PIX, cartões de crédito e maquininhas.
Após críticas, a proposta foi temporariamente suspensa, excluindo fintechs e instituições de pagamento da obrigatoriedade de compartilhamento desses dados.
Como funciona a fiscalização da Receita Federal?
O monitoramento da Receita vai além das informações tradicionais de CPF, endereço e dependentes. Com a ajuda de supercomputadores e inteligência artificial, o Fisco analisa uma ampla gama de dados financeiros, incluindo:
- Rendimentos declarados no IR;
- Movimentações financeiras acima de R$ 2 mil por mês via PIX e débito;
- Pagamentos em cartões de crédito;
- Gastos com educação, saúde e previdência complementar;
- Operações no mercado acionário e com criptoativos;
- Compra, venda e aluguel de imóveis;
- Bens no exterior e deduções por doações.
O objetivo é identificar inconsistências nas declarações e evitar a sonegação fiscal, com foco em movimentações incompatíveis com o perfil declarado pelo contribuinte.
Impacto da malha fina em 2024
No último ano, mais de 1,4 milhão de declarações caíram na malha fina, sendo que 71% tinham imposto a restituir. Os principais motivos foram:
- Deduções (57,4%): A maior parte das retenções foi causada por inconsistências em despesas médicas, destacando a relevância do novo sistema digital de recibos a partir de 2025.
- Omissão de rendimentos (27,8%): Incluindo rendimentos não declarados por titulares e dependentes.
- Diferenças no Imposto Retido na Fonte (9,4%): Divergências entre valores declarados e os informados pelas fontes pagadoras.
- Deduções de incentivo (2,7%): Envolvendo doações para fundos sociais e culturais.
Big Brother fiscal?
A ampliação do monitoramento levantou debates sobre a existência de um “Big Brother tributário”. Mauro Silva, presidente da Unafisco, afirmou que o acompanhamento das movimentações financeiras é comum em países desenvolvidos e essencial para combater a sonegação.
“O Fisco cruza informações sobre bancos, carros, imóveis e PIX. Não se trata de desconfiança, mas de garantir que todos cumpram suas obrigações tributárias. Isso beneficia a sociedade ao reduzir a carga sobre quem já paga seus impostos corretamente”, explicou Silva.
Avanços tecnológicos e desafios éticos
O Receita Federal Digital tem promovido melhorias na experiência do contribuinte, como a declaração pré-preenchida, que utiliza dados de instituições financeiras e outros órgãos para reduzir erros e retenções.
Robinson Barreirinhas, secretário da Receita Federal, destacou que o foco principal não são os pequenos contribuintes, mas sim grandes empresas e operações fraudulentas.
“Nosso objetivo é liberar os auditores para investigar crimes complexos, como lavagem de dinheiro e movimentações financeiras ilícitas. Isso permitirá uma atuação mais efetiva no combate à sonegação em larga escala”, disse Barreirinhas.
O recuo na fiscalização do PIX
Com o recuo do governo, mais de 200 instituições financeiras, incluindo fintechs e operadoras de pagamento, não precisarão enviar dados de transações diretamente à Receita Federal. Segundo o Banco Central, a lista dessas instituições pode ser consultada em seu site oficial.
Embora o governo tenha justificado a suspensão como uma forma de combater fake news e reduzir o ruído social, o debate sobre o equilíbrio entre controle fiscal e privacidade continua.
Com mais de 160 filtros automatizados, a Receita Federal caminha para um modelo de monitoramento fiscal mais rigoroso e tecnológico, mas o desafio será garantir que essas medidas sejam percebidas como justas e proporcionais pela sociedade. Ao mesmo tempo, o governo precisará alinhar transparência, eficiência e respeito à privacidade dos contribuintes, buscando o equilíbrio ideal entre controle e confiança.